Não se pretende nestas parcas letras dissecar a origem nem tampouco a evolução histórica do significado da expressão “politicamente correto”. Não se pretende, também, por manifesta falta de espaço, aprofundar a discussão sobre racismo, política de segurança pública e políticas públicas de combate às desigualdades sociais, nem sequer ensaiar respostas sobre se a PSP terá cumprido as suas obrigações constitucionais no caso Odair Moniz. Tão só registar umas breves notas sobre discursos apelidados de “politicamente incorretos”, proferidos por representantes da República, discursos estes justificados ao abrigo do exercício da liberdade de expressão.
Nos tempos que correm parece ser muito considerado quem fala sem freio, o tal discurso “politicamente incorreto”, com os seus autores logo brindados com cognome a preceito – “o único que diz as verdades” -, independentemente do orador ser o Acácio Tomba-Lobos e o parlatório o Café Primavera, no whisky que rasga caminho para o almoço dominical, ou um qualquer Deputado da República, no hemiciclo ou perante uma câmara de televisão.
Peço desculpa pelo meu conservadorismo rústico, mas falar em público ou em privado não é a mesma coisa e ter cargos públicos ou não, também não é. É que a fala ou a escrita publicada de quem tem responsabilidades tem consequências, é um facto acrescentado ao facto comentado.
Vem tudo isto a propósito do que se disse, recentemente, acerca da morte de uma pessoa na Cova da Moura, baleada pela polícia e as cenas que se seguiram de fogo posto a vários automóveis e autocarros. Com o frenesim mediático, o tremendismo de algumas intervenções, a frase sem freio, “as verdades que toda a gente sabe”, foi-se compondo uma narrativa que tudo reduziu a uma série foleira de polícias e ladrões, uma saga dos bons contra os maus.
Num Estado de Direito há leis e as leis são para cumprir. Quando não são cumpridas há uma investigação, são apurados os factos e deles retiradas as devidas consequências. Às forças de segurança, num Estado de Direito, é conferido (em exclusivo) o poder de utilização da força em determinadas circunstâncias. Sempre que utilizada é necessário averiguar se foi usada por necessidade de facto ou se se tratou de abuso de poder. Tudo e todos estão sob escrutínio, o soberano é a Lei e ninguém está acima dela.
Por muito insosso que possa ser, o que um Dignatário da República tem a dizer num caso como este é lamentar o ocorrido, exigir o apuramento célere do que aconteceu com o retirar das devidas consequências e, obviamente, condenar o vandalismo. É um discurso chato, é. Não tem salero, não. Mas é institucional e politicamente correto e é assim que deve ser e é assim que as instituições e os seus representantes se devem comportar.
O resto é taberna e não devemos instalar a taberna na Assembleia da República.
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