De Minhãos para o Mundo: a paixão pelo treino levou Luís Figueiredo além-fronteiras

Em entrevista ao Discurso Directo, o técnico falou-nos da sua carreira e das várias experiências que vivenciou, em Portugal e lá fora

Há quem tenha uma visão bastante supérflua do futebol, resumindo-o a pouco mais do que um desporto onde 22 atletas correm atrás de uma bola durante largos minutos, pontapeando-a constantemente. E ainda que o futebol se tenha tornado cada vez mais um negócio, repleto de novidades estranhas e cada vez mais afastado do adepto comum, ainda existem várias histórias que valem a pena contar.

É o caso do treinador Luís Figueiredo, natural de Santa Eulália (Minhãos), que atingiu a marca redonda de 20 anos de carreira ligado ao treino e ao jogo. Em entrevista ao Discurso Directo, o técnico falou-nos da sua carreira e das várias experiências que vivenciou, em Portugal e lá fora, bem como dos dissabores que, infelizmente, fazem parte do seu percurso. Após publicarmos, na última edição do jornal impresso, um compacto da entrevista, iremos agora publicar no nosso site, por partes, os vários temas abordados. Nesta primeira parte, iremos conhecer os primeiros passos da carreira de Luís Figueiredo.

  • Quando é que surgiu a paixão pelo jogo e pelo treino?

“Vou ser sincero. Como jogador, fui muito fraco. Eu passei pelo FC Arouca nas camadas jovens, não tive sucesso e cedo me apercebi disso, e tinha uma paixão fantástica pelo treino. Eu era guarda-redes, muitas vezes não concordava com o que o treinador fazia, e refletia o porquê dele fazer aqueles exercícios.

Depois tive também uma grande influência, que foi o José Mourinho. Era uma treinador que vinha da faculdade, fez o percurso como adjunto e tradutor. Quando foi a minha altura de acabar a faculdade, que foi imaginar-me 10 anos depois numa profissão.
Comecei a imaginar-me em várias coisas, mas não conseguia sentir na pele a profissão. Só conseguia sentir-me treinador. O facto de trabalhar com pessoas, de refletir o treino, de construir algo, de levar pessoas a seguirem um conjunto de ideias e meter todas as pessoas a pensar da mesma maneira, era aquilo que me via a fazer.

Comecei a pesquisar como ser treinador. Na altura, podíamos fazer os cursos, mas sentia que precisava de bases para perceber mais do que o jogo. E então, a universidade e, entre várias, encontrei a UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, em Vila Real), que dava, no final da licenciatura de cinco anos, o UEFA C. Na altura, ainda não havia níveis.

Tinha imensas cadeiras que me iriam ajudar a perceber o que é ser treinador e a ensinar, o curso era também para professor. Tinha 5 anos para me ir preparando e recolher toda a informação sobre biomecânica, anatomia, psicologia, didáticas, pedagogias, tudo aquilo que pudesse agarrar, para ser o melhor treinador possível. Fui para a universidade e comecei logo a treinar, em janeiro de 2005, os pequeninos. A partir daí, todas as escolhas que fiz têm sido sempre em função de ser melhor treinador e pessoa, para poder chegar ao patamar mais alto possível.

  • A primeira experiência é pelo Diogo Cão de Vila Real, treinando sub-10 e sub-12. Que recordações guarda da primeira experiência a sério?

“Muito difícil! Quando comecei, um amigo meu, que andava no 3º ano e em janeiro, pela altura das frequências, ele disse-me que precisava de um treinador. E eu disse “Estou aqui eu, vamos lá”.
Comecei com uma equipa C. Antigamente, os melhores jogadores iam para a A, na B estavam os jogadores com alguma qualidade e depois tinha a equipa C que era dos jogadores que não tinham qualidade nenhuma.

Lembro-me de perder aos 16-0, 15-0, 10-0, dos miúdos saírem a chorar e depois é muito difícil motivá-los, mas foi algo que me ensinou muito. O meu objetivo não era os resultados, era fazer com que nenhum desistisse de jogar. Então tinha de pensar em treinos apelativos. fazer com que os miúdos gostassem de jogar, para depois fazer com que eles tentassem melhorar as suas qualidades. Engraçado que essa equipa que eu peguei, no meu primeiro ano, no ano seguinte continuei com eles, depois vou para Itália, e quando regresso vou apanhá-los outra vez em sub-12. Muitos miúdos evoluíram e tenho o orgulho de dizer que dois deles, atualmente, são treinadores, um deles nos quadros do Futebol Clube do Porto. Fico muito contente por ver dois jogadores meus, de há 20 anos atrás, continuam ligados ao jogo e como treinadores.”

  • Primeira experiência como seniores no Mirandela, como adjunto. Tendo em conta que ainda eram os primeiros anos como treinador, sentiu algum choque em treinar uma equipa de jovens, para integrar uma equipa técnica de seniores?

“Não senti grandes diferenças, porque eu ia trabalhando já com alguns atletas seniores. Estive em Itália em 2006, na Lazio, e conheci um treinador de guarda-redes (Giuseppe De Fidio), que era o treinador de GR da seleção italiana, tinha uma escola de GR e era treinador de GR da formação da Lazio.

Na altura, eu e dois amigos assistimos aos treinos de GR, lá está, tentar absorver tudo o que fosse possível, para sermos mais completos como treinadores. Depois, quando acabei a licenciatura em 2009, a questão era “O que vou fazer agora?”. E é muito difícil nós acabarmos a licenciatura e alguém dar-nos oportunidade. “Não tens experiência, queres ser treinador, mas não tens experiência.” Ok, mas se ninguém me der a experiência, nunca a vou ter. Na altura, entreguei vários currículos, mas a conversa era sempre a mesma: “Tens aqui ligado ao futebol de 7, mas não tens experiência para o futebol de 11”.

Então recordei uma coisa que o treinador de guarda-redes da seleção italiana me tinha dito em 2006, que era “Porque é que não abres uma escola de guarda-redes em Portugal?”. Ainda andava a estudar, nem me passava pela cabeça, mas quanto terminei a faculdade, foi um clique. Contactei o senhor, lembrava-se de mim e comecei a colaborar com eles. Ia dar formação a Itália, estive 3 anos durante o verão a ir a Itália. Eles faziam campos de guarda-redes, passavam mais de 100 GR, desde seniores aos mais jovens, para treino específico de GR. Aprendi muito dessa área e foi aí que comecei a trabalhar com atletas mais velhos.

Quando surge a oportunidade do Mirandela, para trabalhar com o meu professor da universidade de futebol, foi também para trabalhar com os guarda redes. Foi como adjunto, com a parte específica do GR, mas sendo um treinador adjunto, de campo. Foi assim que entrei no futebol profissional. Nós fizemos uma época fantástica no Mirandela, estivemos 20 jogos em 1º lugar. Não subimos à Segunda liga, na altura foi o último ano da 2ª Divisão B, nos últimos jogos. Foi o Chaves que acabou por ser campeão, mas fizemos uma época fantástica, a melhor época de sempre do Mirandela, até hoje. Foi um orgulho enorme e apendi imenso, vendo na prática o meu o meu professor da faculdade a trabalhar, e então foi uma época fantástica. Só que depois a conversa, terminando a época, era a mesma da falta da experiência para a oportunidade de treinador.”

Texto: Simão Duarte

Foto: Sofia Brandão

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Discurso Direto
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