Apagão massivo paralisou a Península Ibérica

Um dia atípico que fez regressar velhos hábitos

Segunda-feira, 11h33: o país parou. Um apagão total deixou as pessoas confusas, sem perceberem muito bem se seria apenas mais uma falha de eletricidade momentânea. Mas assim não o foi. A pouco e pouco, começaram a chegar notícias, principalmente através da rádio, que tentavam dar conta sobre o que, de facto, estava a acontecer. Portugal e Espanha foram os principais países afetados – os arquipélagos dos Açores e da Madeira não sofreram qualquer impacto. Existiram também relatos de que partes da França, Itália e Bélgica foram afetadas.

Rapidamente, o caos instalou-se nas principais cidades da Península Ibérica. Barcelona, Madrid e Lisboa registaram problemas nos transportes públicos. Na capital portuguesa e no Porto, as estações do metro foram encerradas. De referir que o dia de ontem foi também marcado pela greve já planeada da CP, aumentando o transtorno instalado. Algumas pessoas ficaram presas nos comboios e nos elevadores, mas as evacuações decorreram pacificamente.

O coração de Lisboa transformou-se numa autêntica confusão. Os semáforos deixaram de funcionar, fazendo com que atos tão simples – como atravessar uma passadeira – se tornassem num temível pesadelo. A PSP foi, deste modo, chamada a controlar o trânsito, mas enquanto acorria aos locais, existiam alguns pontos onde cidadãos faziam o “papel” dos polícias sinaleiros. Pouco depois, a mesma autoridade encerrou as ruas que davam acesso ao aeroporto Humberto Delgado “por motivos de falta de eletricidade”. Os voos acabaram mesmo por ser cancelados.

Por volta do meio-dia, o Governo reuniu-se em Conselho de Ministros para acompanhar a situação. O ministro da presidência, Leitão Amaro, referiu à Renascença que “o problema é europeu e tudo aponta para que a origem tenha a ver com questões técnicas”. Já o ministro Adjunto e da Coesão Territorial, Castro Almeida, não descartou a hipótese de um ciberataque: “Há essa possibilidade, mas não está confirmada”, revelou à RTP3.

Foi também divulgada a informação de que o apagão teria tido origem num ciberataque russo, assim como uma suposta declaração da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Não passaram de notícias falsas.  A reação por parte da Comissão Europeia chegou mais tarde, por intermédio da vice-presidente executiva, Teresa Ribera: “Não estamos a descartar nada de momento, mas não há provas de qualquer tipo de problema de cibersegurança”, reiterou.

A paralisação

Por todo o país, os constrangimentos afetaram (e de que maneira) os diversos setores.

As três principais operadoras de telecomunicações – Vodafone, MEO e NOS – necessitaram de ativar os planos de contingência.  Apesar da rede da SIBS ter continuado operacional, os terminais multibancos pararam de funcionar e os estabelecimentos só aceitaram pagamentos em dinheiro.

Vários hospitais ativaram os planos de contingência e necessitaram mesmo de adiar consultas e cirurgias. Ainda na saúde, o INEM esteve sem conseguir contactar alguns meios próprios, situação que atrasou mais de 100 chamadas e cerca de 400 foram perdidas.

Relativamente à educação, várias escolas e creches fecharam portas. Também as universidades suspenderam as aulas e funcionaram em serviços mínimos. Esta terça-feira, os estabelecimentos de ensino devem “reabrir e funcionar com toda a normalidade”, indicou o Ministério da Educação.

As bombas de gasolina foram funcionando, no entanto, encerraram à medida que a autonomia dos geradores foi acabando.

Em algumas partes do país, existiram cortes no abastecimento de água, particularmente nas zonas altas da cidade de Coimbra.

Nos estabelecimentos prisionais, a Direção Nacional não conseguia garantir que todos os geradores estivessem a funcionar. Isto porque nem todas as prisões os têm e, mesmo as que os possuem, estes não estão operacionais em todas. Além disso, nem todas tiveram condições para servir as refeições.

Sem acesso à internet e à televisão, voltaram velhos hábitos: por todo o país houve uma corrida desenfreada para comprar rádios a pilhas – a única forma de obter informações ao minuto. Com várias estações em emissão especial – nomeadamente, Antena1, Antena2, Antena3, RDP África, RDP Açores, RDP Internacional, RDP Madeira, TSF, Renascença, Observador – a rádio realizou um trabalho notável. Também os supermercados, aqueles que mantiveram as portas abertas, não escaparam a esta procura da população. A fazer lembrar o período crítico da pandemia covid-19, as prateleiras do pão, enlatados, garrafões de água, comida pronta e comida de bebé ficaram vazias em algumas zonas do país.

Adiamentos

Logo na primeira hora do “apagão”, o Open de Madrid foi interrompido em Espanha.

Por cá, a Liga Portugal, em comunicado, informou o adiamento dos jogos desta segunda-feira, relativos à Liga Portugal Betclic e à Liga Portugal 2 Meu Super. Foram adiados os encontros: Casa Pia-Estoril Praia, Benfica B-Mafra e Desportivo de Chaves-Alverca.

Às 21h00, estava agendado o derradeiro debate televisivo. Porém, Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro chegaram a um consenso para o adiamento do mesmo. Até ao momento, ainda não existe nova data para a sua realização.

A retoma da energia

Em Espanha, antes das 15h, a Rede Elétrica informou que já tinha conseguido recuperar a energia em “várias subestações de zonas do norte, sul e oeste da península”.

Foi preciso aguardar mais umas horas para que o mesmo acontecesse em Portugal

Ao final da tarde, a eletricidade começou a ser reposta nos concelhos de Abrantes, Golegã, Mação, Sardoal, Tomar, Entroncamento e Torres Novas. O Sistema de Segurança Interna (SSI) afirmou que a reposição de energia estava a ser feita “de forma faseada e segura para evitar novos desequilíbrios no sistema”. Vários pontos do país festejaram efusivamente a retoma à normalidade.

Na segunda comunicação ao país, às 21h20, Luís Montenegro afirmou que “não é ainda um tempo de balanço, mas quero assegurar-vos que já estamos a trabalhar designadamente com a REN para reforçar a capacidade de prevenção e resiliência de forma a evitar a repetição de ocorrências como esta.”

“Não há ainda um apuramento cabal da origem da situação que levou a este apagão (…) mas há alguns elementos que apontam numa direção: essa origem não está relacionada com a rede elétrica portuguesa e, tendo nós a ligação à rede elétrica espanhola, presume-se que foi nessa que teve origem e que estará relacionada com o aumento abrupto da tensão na rede elétrica espanhola, cuja origem não conseguimos nesta ocasião explicar”, prosseguiu o Primeiro-Ministro

“Nós temos capacidade para produzir e distribuir energia, mas temos uma ligação com Espanha. É verdade que nós, por razões financeiras, estávamos a importar energia de Espanha, porque estava a um preço mais competitivo. Mas mesmo que assim não fosse, fruto precisamente dessa ligação, o apagão em Espanha teria provocado o mesmo efeito em Portugal. (…) Aquilo que teremos de cuidar no futuro é de ter mecanismos de segurança mais desenvolvidos. Há uma oura reflexão que podemos tirar daqui: ao contrário de Espanha, que teve à ajuda das outras ligação que tem – nomeadamente com França e Marrocos – nós estamos apenas dependentes, numa situação de constrangimento, da ligação que temos com Espanha”, concluiu.

O Conselho de Ministros volta a reunir-se hoje, pelas 11h30. Às 14h00, o presidente da Assembleia da República, Aguiar-Branco, vai juntar-se com os partidos e com o Governo.

Esta manhã, a REN – Redes Energéticas Nacionais anunciou que conseguiu restabelecer a rede de transporte de eletricidade “antes do fim do dia de ontem”, indicando que “a rede está perfeitamente estabilizada”. “A REN informa que perante o evento absolutamente excecional, com origem externa, que se verificou ontem às 11h33, e que levou ao blackout de Espanha e Portugal, a REN, um pouco antes das 23h30 do mesmo dia já tinha todas as subestações da Rede Nacional de Transporte repostas”, pode ainda ler-se no comunicado.

Os comboios da Fertagus retomaram a normal circulação às 5h. O mesmo aconteceu com o Metropolitano do Porto às 6h e, pouco depois, com o metro de Lisboa. Também a circulação de comboios urbanos da CP estava, cerca das 07h00, a fazer-se com normalidade.

Antes das 8h00 em Portugal Continental, 99% do fornecimento elétrico de Espanha já tinha sido reposto. As previsões apontam para a situação fique totalmente resolvida que nas próximas horas.

Texto: Sofia Brandão

Foto: Pexels

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