A recente aprovação da segunda revisão do Plano Diretor Municipal (PDM) de Arouca, com uma margem mínima de votos (17 a favor, 16 contra e duas abstenções), evidencia as divisões políticas sobre o futuro do concelho. Este documento, que deveria ser um pilar consensual para o desenvolvimento de Arouca, gerou tanto elogios quanto críticas ferozes, refletindo as reais complexidades do planeamento e ordenamento do território.
De um lado, o Executivo municipal destacou o processo participativo e as soluções propostas como alicerces para um crescimento equilibrado. Por outro lado, a oposição levantou preocupações sobre questões como os aglomerados rurais em solo rústico, as zonas urbanas, a limitação de três pisos, as unidades de execução e a gestão das zonas industriais. Será que o “novo” PDM conseguirá corresponder às expetativas de desenvolvimento harmonioso? Só o tempo – e a prática – o dirá.
A discussão ganha ainda mais relevância quando analisada à luz do Decreto-Lei n.º 117/2024, publicado no mesmo dia da votação. Esta alteração legislativa introduz mudanças significativas ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), permitindo, a título excecional, que solos rústicos próximos de áreas urbanas sejam destinados à construção. Uma medida justificada pelo Governo como essencial para mitigar a crise habitacional, mas que já levanta preocupações sérias. Como habitualmente, as boas intenções colidem com os riscos práticos. A abertura de solos rústicos à construção habitacional pode, em teoria, aumentar a oferta de habitação e reduzir a pressão sobre os preços. Contudo, a experiência ensina-nos a ser cautelosos. Será esta a solução mágica para combater a escassez habitacional? Ou estaremos a abrir as portas ao desordenamento do território, à especulação imobiliária e à degradação ambiental?
A controvérsia é natural. Partidos como BE, PCP, Livre e PAN pediram uma apreciação parlamentar do diploma, temendo que este não resolva as necessidades atuais e, pior, cause danos irreversíveis. Especialistas em urbanismo ecoam estas preocupações, sublinhando a necessidade de planeamento meticuloso e de salvaguardas ambientais robustas.
Por outro lado, este diploma traz uma oportunidade única para reforçar o papel do poder local, atribuindo às assembleias municipais a decisão final sobre a conversão de terrenos rústicos para urbanização. Este é, sem dúvida, um reconhecimento da proximidade dos municípios às reais necessidades das populações. Contudo, exige-se capacitação técnica e uma visão estratégica que nem sempre são garantidas.
No meio de tudo isto, há uma questão que persiste: será possível atingir um equilíbrio entre a expansão habitacional necessária e a preservação do nosso território? A sustentabilidade ambiental e o ordenamento planeado não podem ser sacrificados em nome de soluções imediatistas.
Portugal precisa de mais habitação, mas precisa igualmente de um território bem ordenado e ambientalmente sustentável. A revisão do PDM de Arouca e a aplicação do Decreto-Lei n.º 117/2024 serão dois importantes testes à nossa capacidade de gerir estasforças opostas. A chave estará na implementação prática e, sobretudo, na capacidade de aprender com erros passados.
Foto:Município de Arouca/Avelino Vieira
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