Palcos da discórdia

Como é do conhecimento geral, a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) realiza-se no início de agosto em Lisboa, cidade escolhida pelo Papa para se encontrar com os jovens vindos de todo o mundo.

É certo que não é a primeira vez que Portugal acolhe eventos mundiais de grande dimensão e impacto, mas será certamente um dos que ficarão na memória devido aos avultados custos de organização e a algumas excentricidades. Para já, porque creio que a esta celeuma juntar-se-ão outras, são os palcos que estão a dar que falar. Em vez de elevar a voz da Igreja ao alto, fazem-na rastejar pelo chão, pela incapacidade de argumentar face à incoerência notória entre o discurso e a prática … Senão vejamos: se a Jornada Mundial da Juventude é um encontro com o Papa e ao mesmo tempo uma peregrinação, uma festa e uma expressão dos valores e da fé da Igreja universal, num esforço de reprodução, de ampliação e de reforço da evangelização dos jovens, não deveria a Jornada Mundial espelhar as preocupações, ideologias e expetativas dos jovens? Não deveria ser reflexo e exemplo de simplicidade, de humildade, de proximidade, de informalidade, de diálogo e concórdia? Não deveria zelar pelo equilíbrio e sustentabilidade ambiental, económica e social durante o evento? Não deveria ter responsabilidade social e tornar o evento acessível a todos os jovens? Não deveria a organização da Jornada Mundial ser exemplo de retidão, justiça, rigor e contenção nos gastos? Não deveria ela ponderar bem o custo/benefício? Não deveria contribuir justamente com impostos para com o país acolhedor? São muitas questões, e a maioria continuará sem resposta…

Faz o que eu digo, não olhes ao que eu faço, é um ditado que aqui assenta na perfeição.

Na JMJ falar-se-á de simplicidade em cima de um altar/palco elaboradíssimo; falar-se-á de solidariedade, quando o valor gasto se fosse revertido para fins sociais garantiria o sustento de muitas pessoas subnutridas; falar-se-á em rigor e honestidade, quando as contas da Jornada estão numa nebulosa; falar-se-á em fraternidade, quando os valores morais dentro da própria hierarquia da Igreja tendem a falir…

Apesar dos palcos da discórdia, a Jornada Mundial da Juventude poder-se-á assumir como um grande evento, bem organizado e seguro, cujos gastos são ponderados e reaproveitados no futuro, com infraestruturas polivalentes, capazes de servir vários outros eventos de natureza análoga, ou não, sustentáveis, de baixa manutenção e que sirvam a população.

Esta edição, de 2023, organizada pelo Comité Organizador Local, de forma conjunta e em estreita cooperação com o Governo de Portugal, a Câmara Municipal de Lisboa, a Câmara Municipal de Loures e a Câmara Municipal de Oeiras, tem o Alto Patrocínio da República Portuguesa e poderá ser mais um importante evento que deixa infraestruturas como legado, à semelhança do que aconteceu com a Expo 98 e o Euro 2004, apesar deste último nos ter deixado um elefante colorido em Aveiro, mas que em vez de alegrias vem trazendo vários dissabores ao erário público.

Cabe-nos a nós acompanhar e exigir que as despesas inerentes à JMJ sejam bem escrutinadas e ponderadas, porque para estar com os jovens não é necessária pompa nem circunstância, basta evangelizar como Jesus, com simplicidade e como Nossa Senhora de Fátima que escolheu uma azinheira como palco …

sobre o autor
Ana Isabel Castro
Discurso Direto
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